13.3.09

Os Cinco Assassinatos na Rua Helsink



Nas terras do sertão tudo pode. Pode fome, pode igreja. Pode até tons de luz, de capitais pra nomes de rua. Rua do Breu, Rua do Claro, Rua Helsink. E esse nome mata, eu to te dizendo. Cidade pequena é assim, a gente tudo sabe, tudo ouve,a gente é sol. Foi há um tempo atrás, cinco mortes pra lá de misteriosas, que assombraram até o Fantasma do Monte do Alvorada, que vaga por lá toda santa lua cheia.
Ele era sutil. Por alguma razão, matava só na rua Helsink a rua da Capelinha. A primeira vítima foi mulher, a coitada da Beata Madalena. Ela rezava muito, então deve ter sido a vontade de Deus. Andava atrevida e afobada, a Madalena. Era nova e bela. Era beleza já exilada, coisa rara de se ver. Ali, de manhã, só um corpo sem olhos.
-É um mostrengo, esse aí. Logo ela, que orava e orava. Tadinha. Se não foi na terra, vai ser companheira de Jesus no céu.
O segundo, foi um dia depois. Quando me lembro, passa me uma infeliz coincidência. A segunda morte foi na Terça-feira, tendo a notícia da beata estreado a semana. Pois o Pedro acabava de sair da casa do amigo, e estava vestido de um jeito bem estranho. Sem falar do cheiro de bebida, daquele gagá, que talvez chamasse a atenção do assassino, pois de manhã todo mundo sentiu, quando o corpo amanheceu sem olhos na rua Helsink.
-Tão educado que parecia moça, esse Pedrinho.
Aqui na Igreja não se falava em outra coisa. As beatas estavam com qualquer sentimento que morava entre a Rua do Medo e a dos Infernos. Até rezei uma missa, pra proteger as almas das que ficaram, e Deus queira que não precisasse mais delas no céu.
Mas parece que teria que rezar mais, ou então foi um diacho de praga das macumbas que lançavam por aí, pois não consigo explicar o que aconteceu aqui, até hoje. Na quarta-feira foi a pobrezinha e miserável da Dona Matilde. Fora pegar umas roupas remendadas na Clotilde, a alfaiate. Depois que saiu de lá, ninguém mais a viu em casa, até que uma figura medonha apareceu na Helsink, por entre as brumas daquele outono. Dona Clotilde se defendeu, com todo direito.
-Mas não foi eu não, a pobrezinha da Matilde! Não tinha nada, e agora não tem nem os olhos da vida...
A cidade entrou num consenso, de que a alfaiate era pra lá de Bagdá de inocência. Afinal, tudo que ela espetava era agulha naqueles paninhos e bonecas. Mas eis que o pânico se instalou por essas terras, onde há mortes esquisitas nas ruas de nomes estranhos. Pois eu andei pesquisando outra coisa que não era bíblia, mas uma tal de enciclopédia. Estava escrito com todas as letras, Helsink era a capital da Finlândia. Assim eu disse na missa da quarta-feira , onde todo mundo comeu só peixe, que aquele podia ser o fim do mundo.
- Tem coisa ruim nesse ar, se tem. A dona Mariazinha jurou que viu um homenzarrão, todo de preto. Até o Jagunço ficou com medo e só uivou pra lua. Deu até arrepio na espinha.
A Igreja era como uma válvula de descarrego, pra onde as pessoas canalizavam todo o seu medo e esperança, seja por fé, seja por preguiça de entender os fatos e analisar as possibilidades. De manhãzinha eu fui acordado, com muito sono ainda, por uma Dona Mariazinha aos prantos. Tinha uma grande coleira na mão.
-Essa coleira não é a do Jagunço? O que aconteceu, ele se perdeu na rua?
-Senhor! Oh, Padre de Deus! O Diabo levou meu Jagunço também! Reza pra alma dele ir pro céu!
E não deu outra, lá estava o Jagunço, como uma besta do abismo, de boca escancarada, olhos cegos e mortos. O Jagunço devia tá atocaiando o homem, se devia. Mas o homem venceu o bicho, talvez dando um pedaço de carne envenenada, pela qual todos tínhamos uma queda.
O assassinato da quinta-feira chocou a população, e até deixei fazerem um velório pro Jagunço e tudo, aqui na capela. Quando foi de tardezinha, lá ia a fila, guiada por uma dona Mariazinha ainda inconformada pela tristeza, a de levar o bichinho, que pra mim era um lobão, pra enterrar.
Quando foi noite entrei pra repousar em meu alento, dentro da Capela. Havia corujas e grilos, passeando com os sons do vento. Junto com os lamentos da noite, o arrastar de passos, como um gato tímido que espera para agarrar a presa. Aquilo era pecado, andar na rua uma hora dessas, quanto mais ficar espionando o Padre! Com coragem eu fiquei, e o gato deve ter sentido, pois logo levou para longe seus ronronares de medo e ameaça.
Naquele dia, numa bela de uma sexta-feira treze, a coitada da Dona Ema, uma amiga da Mariazinha, estirada no chão. Tinha arranhões pelo corpo, como quem fugiu de alguém e penosamente caiu para encontrar a morte.
- Logo a minha Mãezinha! Tão boa e gentil! Temos que jogar esse monstro é na fogueira! Roubou os olhos da boazinha! É o Cão!
Prenderam o Leonardo, um bêbado de esquina, que era suspeito só por não ter nada na vida, nem dinheiro, nem mulher, nem nada. Mas de tanto não ter nada todo mundo acha que ele não tinha nem culpa. Ficou uma mensagem para o assassino, porém. Afinal a polícia dali prendia gente, podia ser errada, mas que prendia, prendia. Muitos fiéis pedem a minha benção, parentes dos falecidos. Confessam para mim todo o seu medo e receio. Blasfêmia, sem-vergonhice, falta de dinheiro, besta-crença que corrompe esse povão. A verdade talvez nunca se revele. Pra mim, resta ficar aqui, neste templo de Deus, e digo que com todas as visões que herdei desse mundo, hoje posso enxergar melhor.

1 comentario:

Marcus (Just Cus) dijo...

Noh kra q doido...
adorei esse padre... eh o padre + legal q eu jah vi...heheheheh....

vc deve ser um bom mestre msm... fico mt bom Zé.... espero + contos como esse....heehh...flw