17.3.09

Dona Nhazinha e seu Pé de Acerola


Ele se sentia como o menino dos Componentes da Banda, de um conto da Adélia Prado, a subir no murinho e cair pra outra banda, dessa vez atrás de uma pequenina frutinha. Visão do verde, vaga veloz, vem voando vermelhinha! Existe algum feitiço pra conjurar acerolas?

-Mãe, hoje quero suco natural. Chega de Tang!

-Pois bem, é só pedir a Nhazinha, filha da Zizi, parente do Nhonô que é filho do Tomás.

-A mulher do vizinho, a senhora tá dizendo?

-Sim querido...tem um pé de acerola lá. Acerola, grande irmã da Carambola, filha feita do Fruta-Conde.

-Pára mãe! Vou pedir lá viu?

-Aproveita e manda um abraço pra irmã da Nhazinha, a Nolô, que é uma simpatia de pessoa e é casada com o João do Cobre, que colhia ouro, e se chamava só João, mas isso até encontrar o Girião, que o passou ele pra trás, dizendo que cinco fios de cobre eram mágicos e milagrosos, e daí veio o seu apelido...

Sem querer saber aonde sua mãe havia perdido seu sabão, lá ia ele de encontro ao suco então. Seco dia de verão, cadê a chuva São Pedro! Cravou as unhas na parede, o raiva. Queria mesmo é ser gato, nessas horas. E não é que desceu um bichano nele, patas, bigode e tudo. Virou felino amarelo e felino pulou, depois bem de pé caiu, e novo humano transformou.

-Que fedor de bichento! Tô com pulgas, oh!

O calor era prego na tábua, alí. Daí foi correndo pra baixo do pé. Nada tinha sobrado do orvalho macio nas graminhas, havia apenas um verde bem duro. Estava muito chão quente, aquele lugar. Lembrou então das carrancas no quarto. Podia ele mesmo fazer a água, se podia. E ali mesmo, começou a dançar, sempre abrindo o bocão, imitando a carranca, com aqueles dentões pra fora.

-O chuva aê! O chuva á!

E do nada, aquele aguaceiro. Trovões, até furacões se ameaçaram, com aquele vento todo. Mas era só dar mais uns passinhos, que só água se via naquele canto. Acima, as gotas embelezando a fruta, gorda e macilenta, um vermelho carnal. Que que esse menino não fazia por aquele pedacinho de Eva!

-Vai dar um sucão.

Feito isso o menino pediu uma sacolinha na vizinha, apanhou suas acerolas naquele chuvão e desfez a dança da chuva, imitando agora o boneco do ET, que guardava carinhosamente perto do computador. Quando chegou a janela pra se despedir do garoto, Dona Nhazinha não viu mais que um gato amarelo pulando o muro; e uma ponta de saudade de sua infância, quando ela, Dona Nhazinha, virava Sabiá, pra alcançar as altas mangas do vizinho...

4 comentarios:

Marcus (Just Cus) dijo...

Apesar de não conhecer os "Componentes da Banda" me indentifiquei bastante com esse conto...

...e que saudade de quando eu conseguia ficar na minha forma Yoko....hehehe...

Lolo dijo...

¡Qué bueno!
¿Será que el niño era Renato? Muy bueno el cuento. Me hizo acordar cuando de chico me transformaba no en un animal, sino en viento y cruzaba todo mi barrio. Pero me convertía en viento por otros motivos: sólo para no odiarlo tanto.

Roselysp dijo...

Parabéns!!!!!

Desperte o escritor que há dentro de você e nos presentei com tão agradável leitura!!!

Heverton Oliveira dijo...

=D
muito lindo!
Tao doce quanto um suco de acerola num dia quente de verão, as 6 da tarde, com a companhia agradável de 3 ou 4 amigos da infância!

Que continues escrevendo assim!